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quarta-feira, 30 de março de 2016

quando te conheci eu estava morta. te espiava cotidianamente sob outro nome, uma sombra criada para emular, para continuar levando, que nesse mundo de alma vendida e fortuna que brilha com o sol, nem para se morrer há paz ou descanso. quando te conheci a morte de visitava. e te vi exposta, aberta, dilacerada. eu velei em silêncio sua parceira. vi as quatro patas negras, flagrei nos seus olhos o mesmo brilho do olhar dela. sereno. forte. exposto, mas intransponível, como tu, que queima e incendeia, mas respeita o silêncio que exige a magia, que exige a dor de saber das tramas do destino. quando eu te conheci, morta, eu te amei como se ama quem tem o delírio e o inatingível como força motriz da paixão. e amo como quem devota. e amei sua dor, sua entrega. quando te conheci morta, tive vontade de viver. hoje que vivo me aproximo de ti e tenho vontade de dizer do que não se diz. você bem sabe como é. que somos feitas do mesmo barro. nesse barro de memória, hoje também celebro contigo, em silêncio, mesmo sem nenhuma razão de ser.