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sexta-feira, 28 de março de 2014

sutilezas

A mesa era grande, larga, alta, de madeira e laranja. Cabiam os livros todos, as bagunças todas, livros, fichamentos, chás, mandingas, computador. Cabia a confusão.
Na madrugada perdida, o moço era um encantamento com um mundo que eu queria em ato: uma boca que gritasse rebeldia, ouvisse boa música, não envergasse a espinha e de quebra tivesse riso largo.
O moço gostava de afro-samba, era curioso, bom de prosa e corrigia provas pela madrugada adentro. Por engano acertado do cosmos eu cantei o moço. E eu não mentia não: eu queria mesmo era amor e mais nada. 
Nessa madrugada o moço tinha gosto de melancia e enlace dos seus.
Eu na terra da laranja, da cana, dos amigos e no moinho da minha solidão, queria aquele braço de abraço que eu nem sabia direito se me caberia. Eu queria...
Queria tambem conseguir parir texto, compor, mestrar, amar e fazer alguma coisa com essa existencia presente de viver.

Esses dias tava pensando... O moço agora é quem se debruça sobre uma mesa grande e branca nonde cabem os livros, as angustias, os papéis, os computadores, celulares, fios, memórias, ideias, confusoes e desejos 
Hoje, e agorinha agorinha, quem corrige as provas sou eu.
Antes a janela que dava pro muro, agora dá pra cidade que não para. 
Ele, que tinha quintal que dava pro muro, que dava pras arvores e os cães dos vizinhos, agora vive num apartamento no mesmo que a dona repressão, na cidade onde dizem, fede à bolacha.

E nesse meio tempo, ainda que as janelas tenham mudado de lugar e de mira, nossos corpos se descansem sobre outras sinfonias urbanas, selamos a vontade da caminhada juntos. Encontramos os corpos,  os medos, os sonhos, os mapas dos afetos. Transformamos amigos em padrinhos.

O moço é tudo e tão mais que o dourado que reluz no meu dedinho de criança,  mas assim também o é e segura comigo as flores recolhidas do asfalto da selva, presentes de Iansa e do tempo, enquanto cometo a indelicadeza cruel de sorrir para estranhos no metrô. 

quinta-feira, 13 de março de 2014

luminoso

é como num labirinto íntimo em que as conexões são feitas conforme se anda mais pra dentro de si. e cada um dos passos são pegadas. nos espelhos espalhados pelos corredores estão tantos rostos. (chovia). sabe, mulher? essas coisas não se contam não. mas tem vezes em que o tempo abre uma porta e as coisas se conectam com uma força, que é até perigoso palavrar. (chove). em algum lugar que não aqui. há um pouco eu vi passar de moicano, com uma saia longa. Trazia todo preto um violão. Sentou na esquina da avenida movimentada e ficou contando das coisas da vida. (vai chover). Do outro lado, vinha uma estrela, como todas elas, nua. abria sua caixa enquanto o preto cantava. era de uma alegria abençoada toda aquela bobeira. o labirinto era um porão. a praça, uma rua torta. ("aqui". - [longe] sentir é questão de pele, e bate no violão) sabe? a estrela fez um buquê com flores colhidas do chão. o preto tinha as unhas pintadas do sangue dos dedos cortantes as cordas de um violão feito do aço frio da cidade inteira. dentro daquele lugar que a porta do tempo leva, tudo submerge. não há chão que não seja rio. e não há rua que não seja um trecho de canção. até o sol às vezes tira férias. volta depois furioso por ter sido aparentemente dispensável. ai o sol é menino bobo. esquece que o calor não mora no instante. ele é tesouro que move o mundo. fogo de cortesia e coragem.o preto sussurra e sabe dizer não. a estrela menina nova se perde no labirinto, nos reflexos dos espelhos, nas cartas da caixa, na sombra da verdade, no clarão. tem coisas que não se dizem não. são retiros. são traços. me contaram que a porta se abre pra gente se acalentar nesses dias em que os fardados não tem nome, em que a dor ganha corpo e bota o bloco na rua. que é coisa de silenciar e num perder a fé. o preto sabe da dor das gente. e alumia. ele sabe, que viver de verdade é perigoso - divino e maravilhoso - assim como fazer amor como se deve.

http://grooveshark.com/#!/album/Gil+Luminoso/4492634