A morte em cidade do interior é acontecimento. tudo bem. nem toda morte, mas tem ainda um poder de alterar rotina, de se espalhar pela cidade. não é indiferença pura e acontecimento banal de uma megalópole onde tudo se faz e se anda todo o tempo. não.
Na cadeira do dentista ouvia falar nA rádio da cidade não apenas o nome completo, mas também o apelido carinhoso, que o identificava pela cidade toda. poisé. o Toco morreu.
e a morte na cidade no interior tem um lugar. é. O velório municipal que fica junto AO cemitério da cidade. ali, onde se passa e se sabe se "alguém morreu de novo!?".
ali. na pracinha do cemitério, hoje cheia. e cheia. de todo um borburinho. a morte é local de reencontro, de alvoroço na tarde da cidade. é um murmuro, uma falação. um reencontro na urgência dos dias. A morte é um caderno com listas de nomes, óculos escuros, flores mortas. a morte são letras douradas. ali no salão que pede "silêncio-por favor-obrigado" em letras vermelhas e tortas na parede. a morte é um riso indeciso e um choro in-contido.
nessa tarde, a morte era vestir-se da última e grande paixão da vida. a camisa alvinegra, a cara que descansa depois de tanto sofrer. e não havia ali herói. havia um homem com seus tropeços, amigos, vícios, qualidades e contradições. e sua paixão: o atlético mineiro.
de repente, o silêncio se coloca e a morte desfila. o caixão vem carregado pelos amigos e filhos e rostos sérios, lágrimas e decorado com a bandeira do time do do coração, o único possível e cogitável em toda a passagem por aqui. de repente, a morte é a (in)(con)ciência dos passos lentos de cada um dos presentes de que essa caminhada todos farão. a morte é um belo pôr-do-sol entre as lápides da cidade, um vôo mais urgente que qualquer riso vivo de alegria e a vida um velório cheio na praça e na esquina.
e então, a paixão torna-se canto e alegria. todos os amigos cantam o hino do atlético mineiro. alto e forte e convictos. ali, mais que qualquer oração, discurso, o ritual de passagem, de brindar a vida, a cumplicidade, a riqueza da amizade, suas alegrias e dores, seu valer a pena, ali era aquele hino, palavras de ordem sobre vencer e lutar, sobretudo. síntese. e transbordamento.
"Clube Atlético Mineiro uma vez até morrer", sim. ali, até morrer.
e sim. choramos todos. atleticanos ou não. porque a morte por de ser um aperto no peito de quem escreve, mas a passagem... ah! a passagem é entrega. é re-saber-se. é só contínua-ação.
nossos mortos não nos devem nada. deixem que vão.
(bom descanso, Toco e boa caminhada.)