Páginas

segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

it happens all the time

hoje é realmente um dia em que dói não "poder" falar contigo. sei que poder a gente pode tudo nessa vida, mas ontem mesmo nós reestabelecemos essa linha do não dizer, respeitar o tempo do outro e as frestas de esquecimento, memória, laços, afetos e prosseguir.
não que seja agradável saber do interdito, mas vida que segue, canção que se canta. memórias de silêncios, gestos teus já incorporados ao meu - que é, pra mim, talvez, das formas mais sinceras de amar.
hoje dói porque o Joe Cocker morreu, preto.
desde muito cedo desse relacionar-se que criamos, de passos entrecruzados, você falava, com os olhos brilhando, dos "Anos incríveis", do seu sentir-se traduzido e mais, da força da versão do Joe Cocker pra música "dos besouros", como também gosta de dizer, nesse seu jogo intricado, passional, racional e inevitável com a palavra, a língua e as coisas. E é tanta paixão travestida de imparcialidade que você mal percebe - ou percebe? - o desdém quase herege com que fala dos Beatles.
mas sim, você e todo um mundo inteiro se rasga com o Joe Cocker interpretando a canção dos Beatles, ali, em êxtase, sem nenhum pudor de sentir amor, sentir saudade, sentir-se rasgar. assim, como eu o vi diante dos amigos, na festinha na casa da ariana querida, eu ainda tímida e você e aninha ali, dançando como se a vida fosse um simples permitir-se.
desses novos sentidos que se desvelam na vida, no encontro da palavra do outro, Joe Cocker disse através dos Beatles, alto em bom som. Ali, no mítico vídeo em pleno Woodstock... quer mais motivos pra ser um clássico que hoje nos torna órfãos?
vídeo mítico e que tem paródias, como todo bom clássico. Rio aqui de lembrar da sua insistência em mostrar pras pessoas a versão com a legenda que tira sarro da pronúncia do Joe Cocker...
hoje dói não falar contigo. queria te abraçar e dizer, é, ele morreu. mas fez passagem. não se preocupe. ele continua ecoando no tempo e no espaço. ressoando e reverberando.
queria te abraçar, porque sei que tá doendo. ou só imaginando. mas sei lá... fiquei pensando no meu desorientamento quando soube do Gabriel García Marquez e da minha impotência no saber das coisas da vida, que a morte é parte dela, que todos passamos, e blablabla, que ele tava tão longe de mim fisicamente, mas que ainda assim, doía, egoistamente, doía.
eu sei que dói. e me dói não poder ser cúmplice de um afeto fraterno assim mais.

mas o tempo é o que fazemos dele.
há de passar, mundo andar.

e eu acredito no tempo, sempre disse isso - não que você gostasse dessa frase, mas é verdade. e num tempo grande. e na força que o afeto tem, pralém da nossa vontade imediatista.
então, daqui, dessa saopaulo que chora e vela pela voz que hoje se cala, eu fecho os olhos e te abraço. e te desejo amor.