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terça-feira, 12 de maio de 2015

esquadros

costumava confiar mais nos afetos à distância. a gente ouve tanta coisa sábia sobre o tempo das coisas. sobre o silêncio como grande resposta e momento de contemplação. quando se é expansivo e barulhento demais, mesmo quando se sabe da beleza e da serenidade dessas coisas todas, vivenciá-las é estar sempre de mãos dadas com o desconforto. toda vez que você me chega com essa voz e suas poesias, teus cachos e tua pela negra, eu hesito. sinto que nossa proximidade instantânea, essa intimidade esquisita de mil vidas e tão pouco suor, me toca mais profundamente que a leveza da minha espontaneidade. me calo. quando chegam os teus sinais sonoros, eu ouço e me sinto descoberta. invadida. espero. talvez você pense que eu desdenho - no fundo eu sei que não, mas essa minha dúvida sobre o que você recebe do meu silêncio me motiva a ir lá, te ouvir. deixar tua brisa entrar. e você vem. certeira. voz no tom. poesia. poema. crônica. poema em prosa. outro dia me falava com a palavra de outro de como você precisa desse vício chamado literatura. tenho lido os livros dos olhos dos que se sentam na praça da minha cidade. prestando atenção em cores que eu não sei nome. vendo tudo enquadrado, pronto pra fotografia. estamos tão longe, não é mesmo? e você me acha. e me descobre. e eu te ouço. saiba. te escuto. daqui. e contemplo essa conexão muda. tudo bem. já até tentei algumas vezes te mandar as mensagens pela garrafa. gravar sinais sonoros. ler palavras de outras pessoas. mas não. só não pense que não gosto dessa invasão de intimidade. eu mesma quem abri as portas dela, ao perceber lá atrás que teu riso já não era o mesmo. estou arisca por ser descoberta, por me permitir mergulhos fundos. por admirar a seriedade da intimidade. mas estou aqui. cuidado ao entrar.