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terça-feira, 14 de maio de 2013

medianeras

amanheci em três pontas. minha cidade. lá do sul de minas. onde? qual? depende de quem é você. Posso dizer que é a cidade do Milton Nascimento. do Wagner Tiso. do Café. do Padre Vitor. - nosso preto velho católico, que agora é "venerável" porque a igrejacatólica tá fazendo ele virar no papel o santo que ele já é pro povo. em última instância posso dizer: do lado de Varginha... lembra? a cidade do ET.

amanheci lá. minha cidade. três pontas doida. pequena. 
lá eu moro numa casa grande e afastada do centro. antigamente era longe de tudo e tinha o céu mais bonito que já vi na vida. agora o loteamento chegou. tudo bem, com ele chegou o asfalto. mas também chegaram as luzes laranjas. o céu continua lindo. mas o laranja atrapalha um pouco.

a gente aluga a minha casa grande. sempre tem festa lá. antes tinha mais. um dia, quando a grana der, a gente para com isso. lá tem piscina. ela foi um acontecimento. lembro do caminhão pipa chegando, há muitos bons anos atrás... 

mal nado lá em casa. casa. nos últimos 10 meses, eu tive muitas casas distintas. a casa-do-tunico em araraquara. a chacrinha, lá também. Três Pontas. Santos. marília, a casa com o amor. em São Paulo eu tive um lar emprestado que mora em mim ainda. hoje eu moro aqui, na Rua Clélia "é... perto ali do sesc pompeia!"

estou me acostumando a ter UM lugar de novo, depois de tanta andança. Andança esse que serviu de álibi pro corpo parado. parado. parado. angústia de lar novo nessa selva de pedra: comida, comida, comida.

resultado: corpo mole, pesado, cabeça grande demais.


eu vivo cotidianamente o choque de estar em SãoPaulo. Essa loucura que é estar num lugar com muita gente, no qual pra ir e voltar de qualquer lugar minimamente perto, é como fazer o trajeto TrêsPontas-Varginha como se fosse ali. todahora. 
tem tudo acontecendo ao mesmo tempo-agora.
e estar parado aqui é quase um crime. que cometi muitas vezes nesses três primeiros meses.


hoje eu finalmente resolvi botar o maiô novo e ir visitar a piscina do sesc. vou nadar. me mexer. 
sempre tive muita dificuldade em costurar meu cotidiano com o tempo todo ao meu dispor. parece que fui programa pra seguir uma rotina de fora de mim. a autonomia com meu próprio tempo é um exercício trabalhoso para que eu consiga me construir sem me boicotar. 

hoje eu me lembrei de um dos pedaços de um filme que tanto gosto. 

Medianeras tem um subtítulo em português que dialogava bem com o que eu vivia quando o conheci: "Buenos Aires da Era do Amor Virtual". iniciando um romance a distância, eu sabia bem o que era amar através de uma tela. Não à toa, o filme que é bom por si só, também é uma espécie de amuleto desse relacionamento, recheado e costurado, como todos os outros do mundo, por trilhas sonoras, poemas, filmes, cheiros e sabores.

Mas desde que vim pra São Paulo a história de Martin e Mariana me persegue não pelo amor virtual os encontros e desencontros, de quem tem tanto em comum com alguém que ainda nem conhece direito. O que me persegue é a sensação da cidade grande. Não é Buenos Aires, mas é São Paulo. Um universo todo novo.

A cidade e suas estações. Seus prédios. O crescimento desordenado. O caos de fora. O caos dentro.

Um dos lugares do filme que visitei hoje foi a piscina grande, fechada num prédio, aquecida e cheia de gente.

Eu tinha uma piscina pra nadar ao ar livre, cheia de árvores por perto. Silêncio e Sol. 
Hoje eu parecia uma jacu do interior (parecia?) "como eu faço, chego lá e nado?".

O exame dermatológico é uma bobeira. Enfim, importante. Mas fica lá o japa estirado no sofa do ambulatório. Alguém chega e ele salta ofegante "trouxe traje de banho??" Me troco. Ele vem. Pergunta se tenho isso ou aquilo. Olha os pés e as mãos. E a nuca. E lá se foram 18reais.

Antes do salto, precisei de chave e toca.
ops... salto? 

"moça, é muito rasa a piscina! não pode mergulhar..." "nadar, pode?"

 "moça seus olhos não estão ardendo não??" - MUITO! 
"Toma esse óculos aqui e me devolve. Senão à noite não vai conseguir dormir..."

Na raia que eu nadava tinha um senhor. Logo ele se transformou num moço cheio de disposição. Eu saltei convicta sem nem me alongar - e meus músculos doem todos enquanto digito.
Eu entendi logo a dinâmica de dividir uma raia. Tentava manter um ritmo de forma a não trombar no moço cheio de disposição, mas meus músculos estavam dormindo havia muito tempo. A respiração parecia de fumante. 


Imensa a piscina. E na minha cabeça eu via Mariana, do Medianeras e tentava lembrar da dica que ele ganhara dividindo uma raia "é melhor bater mais a perna ou o braço?"  

não sei. não lembro como nada borboleta e nem peito.
reveso costas e crawl.

tanta gente.

"moço, primeiro dia: descobri também que deixei meus óculos no lugar errado: qual é o lugar certo?"

não enxergo. é o cloro e a miopia. é tanta gente. 
no vestiário mulheres de todas as cores, idades e tamanhos. 
uma menina me olha curiosa... eu logo penso "ela deve tá estranhando meu jeito todo perdido."
eu quero me achar, sorrio e digo: "oi!"
ela ri, sem graça.

diz o nome. pega carteirinha.



hoje eu me senti finalmente vivendo numa cidade grande.

é são paulo, cheguei.
cheguei, são paulo.
cheguei.