Isabela Morais[1]
Resumo:
A
presente comunicação pretende fazer uma leitura crítica da versão feita pelos
rappers Criolo Doido, Rael da Rima e Terra Preta das canções de Vinicius de
Moraes, apresentadas no programa exibido pela Rede Globo, Som Brasil : “O morro
não tem vez”, “Samba da Bênção” e “Canto de Ossanha”. Amparados pela
arquitetônica teórica de Mikhail Bakhtin, além das reflexões de Luiz Tatit
sobre a semiótica da canção, procura-se compreender de que forma as releituras
suscitam novos sentidos, fazendo aflorar novos valores investidos naquelas
canções, através da mudança de gênero musical, entoação, além das próprias
rimas e intervenções dos rappers cujas falas trazem as músicas para o contexto
sócio-histórico presente, resignificando as canções compostas há quase 50 anos
atrás.
Palavras
Chave: Vinicius de Moraes, Criolo
Doido, Canção Popular, Rap, versões.
Abstract:
The purpose of this communication is to make a
critical reading of the version made by rappers Criolo Doido, Rael Rima and
Terra Preta of the songs of Vinicius de Moraes, presented in the programme
aired by Rede Globo, Som Brasil: "O morro não tem vez", "Samba
da Bênção" and "Canto de Ossanha". Sustained by the theorical
architectural of Mikhail Bakhtin, in addition to theoretical reflections of
Luiz Tatit on the semiotics of song, seeks to understand how the
reinterpretations of new senses, making touch new values invested in those
songs, through the change of musical genre, intonation, in addition to the own
rhymes and interventions of rappers whose lines bring the songs to the
socio-historical present, giving new senses to the songs composed for almost 50
years ago.
Keywords: Vinicius de Moraes, Criolo Doido, Popular Song, Rap,
versions.
Pra começo de conversa:
Em abril de 2007, a Rede Globo de
Televisão levou ao ar uma nova versão do programa Som Brasil, cuja proposta é basicamente fazer uma homenagem a
grandes nomes da música popular brasileira, convidando músicos, bandas, grupos
e intérpretes contemporâneos para fazerem releituras de suas canções. O
primeiro homenageado foi Vinicius de Moraes, cujo extenso cancioneiro foi
erigido ao lado dos mais diversos parceiros. A história oficial, por sua vez,
enfatiza sempre a célebre parceria com Tom Jobim, muitas vezes destacando
apenas este período da produção de Vinicius, como um compositor de Bossa Nova.
Se por um lado a importância deste movimento não pode e nem deve ser negada,
por outro a amplitude da obra de Vinicius de Moraes não deve ser restringida a
este movimento (nem mesmo a obra de Tom Jobim permitiria tal restrição a um
movimento apenas).
Tal afirmação se justifica pela
própria escolha do repertório que compôs o programa Som Brasil: das quinze canções, oito delas são em parceria com Tom
Jobim; apenas uma contempla o seu parceiro mais duradouro e também derradeiro,
Toquinho, “Tarde em Itapoã”; também é apenas uma canção composta ao lado de
Carlos Lyra considerado por Vinicius de Moraes um de seus principais parceiros,
“Coisa Mais Linda”, canção que também evoca ao que conceito mais “clássico” de
Bossa Nova, diferentemente de outras canções da dupla, principalmente as
consideradas músicas de protesto, como “Maria Moita”, por exemplo; “Lamento”,
música de Pixinguinha pra qual Vinicius de Moraes escreveu a letra
posteriormente e, por fim duas canções compostas com Baden Powell, “Samba da
Benção” e “Canto de Ossanha”, que integram uma safra específica de composições
da dupla, os Afro Sambas.
Os artistas convidados para as
releituras das canções de Vinicius foram a consagrada intérprete Gal Costa,
cantando “A Felicidade”, “Insensatez”, “O Amor em Paz” e “Se todos fossem
iguais a você”; o grupo BossaCucaNova, que faz releituras de canções Bossa Nova
misturando-as com a sonoridade da música eletrônica contemporânea, apresentou
as canções “Água de Beber” e “Tarde em Itapuã”, com a interpretação de Cris
Delano e “Garota de Ipanema”, com a participação também de Ed Motta; o músico
Chico Pinheiro que cantou ao lado de Tatiana Parra e Luciana Alves em leituras
mais próximas das originais “Chega de Saudade”, “Lamento” e “Coisa Mais Linda”;
e, por fim, as releituras que nos interessam aqui dos rappers Criolo Doido,
Rael da Rima e Terra Preta junto com o violonista Marcel Powell de “O morro não
tem vez”, “Samba da Bênção” e “Canto de Ossanha”.
A perspectiva da conversa:
A proposta deste artigo é fazer uma
leitura crítica das releituras dos rappers. Algumas ideias permeiam nossa
leitura, nosso olhar para tais releituras. Uma das ferramentas teóricas
utilizadas nesse exercício é a arquitetônica teórica de Mikhail Bakhtin, a
começar pelo seu conceito de eventicidade: o sentido do enunciado é construído
a partir do seu contexto, um mesmo enunciado proferido em duas circunstâncias
diferentes já não é o mesmo, pois possui um novo sentido.
Outra
dimensão da arquitetônica bakhtiniana é o tom volitivo emocional que permite
entender a singularidade de cada enunciado, ou seja, a sua entoação. No caso da
canção popular, uma mesma música pode ser interpretada por diferentes maneiras,
seja modificando os arranjos, seja alterando a entoação, seja, conforme os
conceitos trabalhados por Luiz Tatit, alterando as formas de concentração e
expansão, aceleração e desaceleração. Segundo Tatit, dos diversos valores
investidos numa obra no momento de sua composição, apenas alguns se manifestam
no momento da execução. Logo, as diferentes interpretações e releituras de uma
mesma canção são capazes de fazer aflorar tais valores. É partir dessa
perspectiva que pretendemos analisar a releitura das canções “O morro não tem
vez”, “Samba da Bênção” e “Canto de Ossanha”.
A arquitetônica bakhtiniana
preocupa-se em dar conta da singularidade de cada enunciado, entendendo-o não
de forma absoluta, mas num diálogo ininterrupto com o contexto sócio-histórico
que o circunda, seja enquanto resposta imediata a uma determinada
circunstância, seja dentro de uma compreensão de uma grande temporalidade, onde
os sentidos remetem a experiências e enunciações passadas, e cujo a
possibilidade de leitura não se esgota diante do devir, uma vez que todo o
enunciado é aberto e inconcluso, respondendo a compreensão ativa daquele com o
qual dialoga. Entender esta singularidade demanda entender a arquitetônica específica
do enunciado, onde, como, por que, por quem, pra quem, o que, quando foi dito.
Calçada pra favela, avenida pra
carro, céu pra avião, e pro morro, descaso[2].
A
única canção interpretada pelos rappers em parceria com Tom Jobim é “O morro
não tem vez”. O próprio título da canção
anuncia que não é uma canção marcada pela leveza da lírica apaixonada e tantas
vezes rotulada como alienada da Bossa Nova, ela está muito mais próxima daquilo
que se convencionou chamar de Bossa Nova nacionalista, canção engajada, ou
ainda, simplesmente, música de protesto. Composta em meio à efervescência
política dos anos 1960, “O morro não tem vez” reflete na sua letra preocupações
caras aos debates estéticos e engajados da época. Desde meados dos anos 1950,
alguns tipos e lugares sociais passaram a se destacar nas narrativas artísticas
comprometidas com a crítica social brasileira: sertão, morro, malandros,
operário, camponeses.
Cabe
aqui prestar atenção no eu lírico da canção: o sujeito não se confunde com o
morro, não é um habitante de lá e nem se dirige aos próprios habitantes, mas
sim a uma outra classe, com a qual também não se confunde. “O morro não tem vez
e o que ele fez já foi demais. Mas
olhem bem vocês, quando derem vez ao
morro toda a cidade vai cantar”. Esta passagem reflete a postura do intelectual
engajado, a juventude de classe média, aliada aos interesses ideológicos de
esquerda – e não nos esqueçamos da influência do PCB na cultura engajada desde
os anos 1950, na qual tal intelectualidade procura forjar com a arte uma
consciência dos problemas sociais do país. Entretanto, o eu lírico aqui não
fala “ao povo”, mas “sobre o povo”, senão para a sua própria classe, para as
classes dominantes.
O verso “quando derem vez ao morro toda a
cidade vai cantar” traz à tona a importância da música nos discursos sobre o
morro. Os debates historiográficos sobre o samba constituíram ao longo das
décadas de 1930-1960 a ideia de que o morro seria o lugar social do verdadeiro
samba. O livro organizado por Alba Maria Zaluar e Marcos Alvito Pereira de
Souza “Um Século de Favela” (2004) demonstra como ao longo do século XX
gradativamente vai se constituindo nas letras das canções populares uma
identificação entre morro, favela, samba e escola de samba, no qual a música e
a dança muitas vezes aparecem como reforço dos laços de pertencimento,
solidariedade e amizade entre os moradores.
Não à toa os últimos versos da
canção fazem referência ao Carnaval “abram alas ao morro”, “é mil a batucar”,
“tamborim vai falar”. O carnaval é apresentado como um ritual de inversão, no
qual o morro reina na cidade. O eu lírico a partir dessa imagem propõe então
que seja dada vez ao morro não só neste tempo, o que traria para a cidade uma
nova sociabilidade “toda a cidade vai cantar” – entendendo aqui o canto não
apenas como o carnaval, mas como o próprio meio de vida, idealizado,
evidentemente, que o morro poderia apresentar à cidade.
A música composta em 1963 é então
reapresentada 44 anos depois. O ritmo não é mais o samba, mas sim a batida do rap,
o que já provoca uma outra entoação na canção. Menos melódica e mais falada,
citada. Por sua vez, a harmonia e os arranjos deixam a canção com uma atmosfera
mais tensa e séria. Se pensarmos na conhecida versão de Elis Regina no álbum
“Dois na Bossa”, gravado com Jair Rodrigues, a diferença é gritante. Elis
Regina canta a primeira estrofe destacando o desenho melódico do fraseado,
cantando-o de forma desacelerada, cuja entoação cria um sentido de lamento para
o verso, como um canto triste.
Vejamos então a versão dos rappers.
Rael da Rima introduz a música anunciando:
“Criolo
Doido,
Rael
da Rima,
Terra
Preta,
Marcel
Powell,
Iporanga,
Grajaú,
Time
do Loko
Vem
cá, meu brow”
Os três rappers cantam em uníssono a
primeira estrofe da canção: “O morro não
tem vez/ E o que ele fez/ Já foi demais/ Mas olhem bem vocês/ Quando derem vez
ao morro/ toda a cidade vai cantar”
E então Rael inicia a sua rima:
Se
derem vez ao morro
e
não deixá pá nós só a polícia e os cachorro
Sem
emprego, tá difícil, mas nós vai virá o jogo
Com
a arte que liberta e traz um raciocínio novo
Um
raciocínio novo
E
tanto faz se for favela, o morro vem com nós
Do
Iporanga ao Grajaú nós vai soltá a voz
Pra
libertar e resgatar o que há de valor
E
pra mostrar que na favela também tem amor
Na fala de Rael da Rima podemos
notar uma nova perspectiva discursiva inserida na canção: aqui não é alguém
falando de fora do morro, mas sim alguém está inserido naquela realidade. A
aura de idealização da realidade do morro vai abaixo já nos primeiros versos
recitados por Rael, mencionando a violência policial vivenciada no cotidiano. O
discurso, entretanto, não é pessimista. O rapper acredita que é possível mudar
a situação “virar o jogo”.
No discurso de Rael é reafirmado,
ainda que noutra perspectiva, a noção de que a arte promove uma transformação.
Novamente foram citados os locais Iporanga e Grajaú, evidenciando o orgulho do
pertencimento a um lugar, à periferia, aqui identificada com o morro. O mesmo
orgulho cantado pelos sambistas do morro, aqui reiterado. “Morro” aqui
simboliza não apenas os morros cariocas, mas há uma identificação com a favela
e a periferia em geral. Criolo Doido nasceu e cresceu no Grajaú, distrito
paulistano. Recentemente o rapper lançou a música “Grajauex”, no seu álbum mais
Nó na orelha, reiterando o orgulho de vir da periferia.
Segundo
Criolo, a arte na periferia das grandes cidades brasileiras está ganhando força
e visibilidade devido à “necessidade [das
pessoas] de viver coisas boas e fazer parte de coisas boas. Necessidade de
contribuir com a nossa comunidade e com o mundo” (CRIOLO apud VERGUEIRO,
2011). E ele é enfático ao lembrar que “as artes sempre existiram na periferia,
mas só estão enxergando agora. O pessoal está atrasado. O preconceito deixou as
pessoas cegas”. (grifos da autora)
Ou seja, dar vez ao morro é deixar
de ser cego e ouvir o som que vem de lá, ouvindo a voz dos rappers que gritam
que na favela “também tem amor”.
Depois da rima de Rael os rappers
retomam: “Morro pede passagem/ Morro quer
se mostrar/ Abram alas pro morro/ Tamborim vai falar”
A entoação desta parte é bem
diferente do canto melódico da versão original. Os rappers entoam cada sílaba
de forma marcada e destacada “Mo-rro-pe-de-passagem”, “Mo-rro-quer-semostrar”
“A-bram-a-las-promorro” e no verso “Tam-bo-rim-vaifalar”, os tons da bateria
são batidos no tempo da enunciação, deixando bastante enfática e imperativa a
estrofe. E continuam em coro uníssono: “É
um, é dois, é três, é cem/ é mil a batuca/ O morro não tem vez/ Mas se derem
vez ao morro toda a cidade vai cantar”
Criolo
Doido começa então a sua rima:
Plantaram
indiferença
Regaram
com a arrogância
E
a gente assim
Dança
uma dança
Entre
o fogo da arma
E
a brisa da ganância
Como
uma criança
Disso
vai manter distância?
Em
cada rua dez buteco, cinco igreja,
três
biquera e uma esperança
A
mãe vê o filho com abundância
Aprendi
que só se colhe o que se planta
Compreensão
pros louco
E escola pras criança
Criolo Doido também enfatiza a
atmosfera pesada e não idealizada do morro, cuja indiferença, que Vinicius de
Moraes já anunciara, ao pedir que se dê vez ao morro há quatro décadas, foi
responsável pela situação difícil na qual as crianças são obrigadas a crescer e
testemunhar. Criolo Doido percebe a situação do morro como sintomática e reversível,
já que se “colhe o que se planta”: se deixarmos de plantar indiferença e regar
com arrogância, mas sim plantarmos compreensão e educação, oportunidade,
possivelmente a situação pode se transformar, no colher nos frutos.
Por fim, Terra Preta encerra a
música com a sua rima:
Eu
vou além
Mais
do que um compromisso
Do
Rap, Bossa Nova, os sambas de Vinicius
Acontece
isso
sei
que é inevitável
Juntou
Tom Jobim, cancioneiro implacável
Ei,
pensando bem
a
vibração faz um desenho
As
notas do amor são como música um prêmio
O
que me faz dar valor a minha arte
O
som que vem do morro se espalha por toda parte:
Morro!
Os três rappers cantam juntos “Morro!”, demonstrando muito orgulho de
cantarem o morro. A rima de Terra Preta menciona a tão falada e consagrada
parceria de Vinicius e Tom Jobim, mencionando o diálogo entre os sambas e o
rap, mostrando a possibilidade de diálogo entre eles ao cantarem as notas do
amor. Este diálogo que permitiu aos próprios rappers estarem ali espalhando o
som do morro por toda a parte. Estar ali, em um palco da Rede Globo, sendo
televisionados para o país todo, como representantes do morro, levando as rimas
do rap. Criolo Doido tem clareza do que significa isso e deixa bem claro na
próxima música.
Pelas ruas o que se vê é uma gente
que nem se vê[3]
“Samba da Bênção” é a primeira
canção de Vinicius de Moraes em parceria com Baden Powell a ser apresentada no
programa. Composta em 1962, ano do encontro dos parceiros, ela faz parte da
primeira leva de canções da dupla e antecipa alguns elementos de uma safra de
canções que eles viriam a compor e denominar Afro Sambas.
“Samba da Bênção” é uma homenagem a
Vinicius ao samba. Não é incomum encontrar sambas que falem do próprio samba.
Entretanto, Vinicius de Moraes aqui mescla a lírica da canção com a sua poesia
e entre um verso e outro cantado, ele recita algumas rimas, características de
sua produção, como a receita da mulher amada, o desejo de aproveitar a vida e
por fim a louvação e pedido de bênção aos sambistas desde a geração de Sinhô,
os sambistas do Estácio, a geração de 1930, chegando aos seus parceiros
contemporâneos, como Tom Jobim e o próprio Baden Powell. Tal reza tem uma estrutura de base, mas se
transforma ao longo da carreira de Vinicius, que vez ou outra adiciona alguns versos,
transforma outros.
Na primeira estrofe ele enfatiza o
caráter ambivalente do samba, que não deve ser feito apenas da matéria da
alegria, mas também é necessário um “bocado de tristeza” pra se fazer um samba.
Na estrofe seguinte ele reitera a ideia de que o samba é “tristeza que balança”
condenando aquele que faz samba apenas com a alegria, como se ele fosse piada.
Na última estrofe, Vinicius de Moraes clama por amor – característica de sua
criação poética – e responde a uma querela que permeava os debates
historiográficos da época sobre o samba: o lugar de seu nascimento.
A versão apresentada no Som Brasil começa com um o violão de
Marcel Powell homenageando o pai, Baden. Em seguida, Criolo Doido começa a
cantar. Ao final da primeira estrofe, Criolo Doido levanta o dedo indicador,
indicando a entrada do DJ e do restante da banda e então começa seu rap:
Cê
quer saber,
Então,
vou te falar,
Porque
as pessoas sadias adoecem,
Bem
alimentadas, ou não,
Porque
perecem.
Tudo
está guardado na mente,
O
que você quer nem sempre condiz com o que outro sente.
Eu
tô falando é de atenção,
Que
dá cola ao coração.
E
faz marmanjo chorar,
Se
faltar um simples sorriso, às vezes um olhar.
E
que se vem da pessoa errada, não conta,
Amizade
é importante, mas o amor escancara tanto.
E
o que te faz feliz,
Também
provoca dor,
A
cadência do surdo no colo que se forjou.
E
aliás, cá pra nós, até o mais desandado,
Dá
um tempo na função, quando percebe que é amado.
E
as pessoas se olham e não se falam,
Se
esbarram na rua e se maltratam.
Usam
a desculpa de que nem Cristo agradou.
Falô!
Cê vai querer mesmo se comparar com o Senhor?
Rael da Rima então completa:
As
pessoas não são más, mano
Só
estão perdidas
Ainda
há tempo irmão
Tal rap é a primeira parte da música
“Ainda há tempo”, lançada por Criolo Doido, em 2006, no álbum homônimo,
primeiro CD do artista, depois de 17 anos atuando como rapper. Percebemos aqui
que o enfoque do rap de Criolo evoca um novo sentido ao samba de Vinicius,
contemplando um tema que fora mais explorado pelo poeta em outra canção,
“Marcha da Quarta-feira de Cinzas”, falando sobre a falta de atenção entre as
pessoas. Criolo Doido parece atender ao pedido do verso “ponha um pouco de amor
numa cadência” e faz seu rap falando da importância do amor. A centralidade
passa a ser justamente do primeiro verso: “é melhor ser alegre que ser triste”.
O rap de Criolo está voltado para a
indiferença entre as pessoas nas grandes cidades, tema recorrente no trabalho
do rapper em suas narrativas sobre São Paulo e sua periferia. Aliás, uma canção
que dialoga muito bem com esse tema é “Não existe amor em SP”, lançada no álbum
de 2011 Nó na Orelha.
O rap enfatiza que as pessoas não
sofrem apenas por falta de recursos materiais, mas também por falta de amor e
de atenção. E o rapper aqui não faz distinção da importância destes afetos para
as pessoas ao dizer que “até o mais danado dá um tempo na função quando percebe
que é amado”. Ou seja, o amor tem o poder, ainda mais que a amizade, de
transformar e regenerar as pessoas. Tal ideia fica clara na fala de Rael da
Rima ao afirmar que “as pessoas não são más” e “que ainda há tempo”.
Se pensarmos então no cotidiano das
grandes cidades, nas pessoas que se cruzam e não se olham, pequenas atitudes
como “um simples sorriso” ou então “um olhar” podem transformar as relações
frias e reificadas, já que fica evidente no discurso dos rappers até aqui a
crença na possibilidade de transformação das relações e das pessoas. Tal
transformação por sua vez demanda exercício e Criolo critica aqueles que se
acomodam com a desculpa de que nem Cristo agradou.
Criolo Doido dialoga com Vinicius ao
falar sobre o caráter ambivalente do amor que ao mesmo tempo cura e provoca a
dor, contemplando o tema de outra canção do poeta “Tempo de Amor”.
Intencionalmente ou não, a segunda
estrofe cantada de Samba da Bênção não foi cantada na versão dos rappers. Após
a rima de Rael, Criolo Doido retoma a canção já no último verso, que dialoga
com a rima que ele havia feito: “ponha um pouco de amor numa cadência...”.
Após a estrofe final da canção,
Criolo improvisa:
É
melhor ser alegre que ser triste
Pena
que tem gente que insiste
A
tristeza fermentar
A
morada desse samba
É
o coração de quem ama
E
o meu verso veio de lá
Só
mesmo a arte pra trazer a gente pra cá
E
se hoje eu to na tela
A
tela se torna um pouco favela
Aonde
existe uma gente tão bela
Que
dá gosto de representar
Destaco aqui a fala de Criolo: “só
mesmo a arte pra trazer a gente pra cá”. Somente a arte para poder levar os
três moradores e cantadores da periferia para a tela da Globo. A presença dos
rappers é a própria presença da favela, mais uma fez reiterada, lembrada e cujo
orgulho novamente se renova. O rapper que demorou quase duas décadas para
gravar seu primeiro disco tem plena noção do que é ocupar um lócus
representante da cultura e poder hegemônicos e faz questão de deixar registrado
isso.
Dois anos depois da exibição do
programa, a Globo Marcas e a Som Livre lançaram o programa em DVD. A capa do
DVD é bastante sintomática: em destaque a imagem de Vinicius de Moraes com
microfone a punho, seu nome grafado no centro da imagem e logo abaixo duas
fotos de Gal Costa, uma delas registro da gravação do programa – o que
percebemos pela roupa – e a outra um close dela em outro contexto, o que
percebemos pelo microfone e pelo seu penteado. Do lado da foto a logo do
programa e abaixo, em letras miúdas o nome de Gal grafado em negrito e abaixo
os outros convidados.
Achamos aqui sintomático que Gal
Costa seja o grande destaque da capa. Além de consagrada, Gal reafirma nas
canções que interpretou e da forma como interpretou o Vinicius de Moraes da
Bossa Nova, das aberturas da novela de Manoel Carlos. Gal goza de status e
respeito, não desmerecidos, ao contrário. Mas por que não colocar na capa do
DVD a cara dos outros artistas? As músicas que tocam no menu do DVD também são
as versões de Gal Costa, ela é então a grande estrela?
Desta forma fica evidente que ainda
que tenha sido dado um espaço para as outras leituras possíveis de Vinicius, a
leitura que Gal representa é a hegemônica, é a que vende.
A aparição dos rappers é uma brecha
e eles sabem disso, e deixam bastante claro. Estão estrategicamente ocupando um
lugar.
Coitado do homem que vai atrás de
mandinga de amor
Das três músicas gravadas, esta é
sem dúvida a que mais foi regravada, recebendo as mais diversas leituras:
“Canto de Ossanha”, a primeira faixa do antológico álbum lançado em 1966 da
dupla Vinicius de Moraes e Baden Powell, “Os Afro Sambas”. A letra ambígua da canção sugere movimento.
Não há a coincidência do eu: a perspectiva de constante devir e transformação
está presente em toda a primeira parte da letra.
Uma
das características mais marcantes da versão de Vinicius e Baden no álbum de
1966 é o caráter coletivo da canção, que mantém um diálogo com as formas
populares, se utilizando do recurso da responsividade: uma voz puxa um verso e
o coro responde. Tal característica é mantida na versão dos rappers. A primeira
parte da canção, em que há o canto responsivo, tem uma entoação mais próxima da
fala, que pode ser potencializada pelos rappers.
Terra Preta puxa o canto, que os
outros dois rappers respondem. Nesta versão a segunda estrofe, tal como em “Samba
da Bênção”, também não foi cantada.
Após o primeiro refrão, cantado em
solo por Rael da Rima, ele e Terra Preta iniciam um diálogo:
Terra: E a fita do terreiro lá, djou?
Rael:
Não sei!
Terra: Mas Ossanha não te falou, tru?
Rael:
O quê?
Terra: Aquilo que tinha que dar, “vá”!
Rael:
Não dei!
Terra: Por isso isso ficou só, sem amor.
Rael:
Quando se fala de Ossanha,
respeito
na manha.
Fez
nada e num cumpriu,
se
pá, até apanha
da vida corrida, bonita, estranha.
No
jogo do amor, é sério,
você
perde ou ganha, vai...
O diálogo dos dois remete ao
ambiente do terreiro e ao orixá. Ossanha é o orixá responsável pelo domínio e
conhecimento das ervas e folhas e seus encantamentos e poderes. Todo e qualquer
trabalho no Candomblé só acontece mediado pela ação de Ossanha, devido a tal
poder. O diálogo dos dois se refere à “mandinga de amor” que só pode ser feita
por intermédio de Ossanha. Rael não levou o que o orixá pediu e por isso ficou
sem amor.
A “mandinga de amor” nos remete a
uma atitude bastante comum entre uma parcela dos brasileiros que, mesmo devotos
de outras religiões, por vezes procuram terreiros de candomblé, umbanda,
jogadores de búzios, benzedeiras em busca de soluções para os problemas
imediatos. Herança do cristianismo popular e a possibilidade de sincretismo com
as outras influências religiosas, que acabou constituindo um povo que ao mesmo
tempo que devota sua fé aos rituais católicas e monoteísta, acredita em
mandingas, feitiçarias, má sorte, e a mais diversa sorte de santos, espíritos
e, porque não, orixás. Tal panorama tem se transformado nas últimas décadas em
decorrência do aumento vertiginoso das evangélicas, mas não no sentido de negar
a multiplicidade espiritual, mas ao contrário, relegando toda a diversidade ao
maniqueísmo de “manifestação” do diabo.
Rael da Rima canta um rap relatando
a dificuldade do sujeito em se relacionar seriamente e sem saber o que fazer
diante de mais uma oportunidade de se envolver:
Escolhi
carreira solo, porque eu me complico
Mas
mi-na até descoloco, mas com nenhuma fico
Elas
me chamam de locão, de putão, canastrão
Mas
eu faço que não, o que o problema é de coração
E
me aparece você, querendo agora transmitir seu
Calor
Não
vou mentir que curti te beijar ontem a noite
Tocar
de monte e curtir com ontem
Eu
já conheço o começo e o final
O
problema é em mim
Tá
comigo, eu já sei do esquema
Eu
perdi a pretinha, a loirinha, a pequena
E
agora o que eu faço contigo na cena, (vai!)
O rap é trecho da música “Já não
sei”, que seria lançada no ano seguinte no álbum Natural, do grupo Pentágono, formado, por mais quatro rappers além
de Rael da Rima: Apolo, Massao, M Sário e DJ Kiko. Natural é o segundo álbum do grupo, formado em 2001. Em 2004 se
destacou na MTV ao concorrer na categoria de melhor clipe de rap com “Na
Moral”, faixa que integrou o primeiro disco do grupo Microfonicamente Dizendo lançado naquele ano. Aliás, na introdução
de “O Morro não tem vez”, Rael da Rima se refere à gravadora, independente, destes
dois álbuns, a Time do Loko.
A linguagem utilizada pelos rappers
se distingue claramente do tipo de linguagem cunhada por Vinicius de Moraes. Os
motivos são evidentes: há uma distância de tempo e espaço entre eles, mas não
uma distância qualquer. Ainda que Vinicius de Moraes fora ao longo da sua
carreira de compositor popular aderindo a uma linguagem cada vez mais despojada
e próxima do cotidiano, como podemos perceber nos versos de “Samba da Bênção”,
sua linguagem ainda é bastante próxima do que se entende como língua dominante
e normal culta do português. Entendemos aqui a relação cronotópica enraizada
socialmente e não como categorias a priori. A distância entre Vinicius e os
rappers é uma distância de classes e de pertencimento a lugares sociais, e
trânsito por diferentes lugares sociais, muito distintos e singulares.
Dentro de uma mesma língua há muitas
linguagens possíveis. É o que Bakhtin (1998) entende por plurilinguismo. Cada
ambiente social dispõe de seus códigos, gírias, entoações próprias. Uma
característica marcante do discurso dos rappers é de não abrir mão da linguagem
corrente do ambiente no qual convivem, do qual vêm. O plurilinguismo é evidente
no rap, que traduz as vivências em diversos ambientes para a linguagem da
periferia, as conjugações verbais e atropelos de concordância característicos
da fala cotidiana. Não é sinal aqui de falta de domínio de uma norma culta,
seja lá por quais motivos forem. Trata-se de entender a adoção dessa linguagem
em si como uma forma de transgressão, de determinar um território, marcar uma
singularidade, amplificar uma voz. O berro de uma classe.
Desta forma os sentidos suscitados
pela lírica viciniana são traduzidos pelos rappers não apenas para a sua
percepção contemporânea das relações, mas também para a sua linguagem. Algum
purista poderia alegar que os rappers sujaram a música viciniana, mas a
despeito do que possam pensar por aí, muito provavelmente o poetinha teria
gostado das novas leituras de suas canções.
Na publicação da sua peça “Orfeu da
Conceição”, de 1954, Vinicius de Moraes faz duas ressalvas quanto à atualização
da peça: que sejam mantidas as canções que compõe a trilha, compostas ao lado de
Tom Jobim e que as gírias presentes no texto são só fossem mantidas, mas também
atualizadas. Vale lembrar o profundo desejo que Vinicius tinha que sua peça
fosse assistida pelo povo, comunicasse com ele, pois fora feita em homenagem a
ele. A peça que levou pela primeira vez ao palco do Theatro Municipal um elenco
totalmente negro foi também apresentada no Teatro República, em 1956, ano de
sua montagem, na esperança de que o povo pudesse assisti-la num ambiente em que
o deixasse mais à vontade que o pomposo Theatro Municipal.
Logo,
se era desejo de Vinicius que sua arte comunicasse amplamente com os mais
diversos estratos da sociedade; se fora parte da sua história, marcando a sua
própria introdução no campo da música popular a homenagem ao morro carioca, seus
sambistas, seu povo e seus sons; se era desejo de Vinicius que sua peça
atualizasse a linguagem do morro, não há como não concluir que as leituras do
rappers contemplassem o poeta.
Além do mais, o discurso sobre a
importância dos afetos, sobre a crença na transformação, tão caros a Vinicius
estão ali, presentes nas falas dos rappers.
A vida é a arte do encontro[4]
Um
ano antes da gravação do Som Brasil,
a apresentadora Regina Casé, o antropólogo Hermano Vianna e o diretor e
produtor Guel Arraes criaram o programa Central
da Periferia: um programa de auditório ao ar livre e itinerante, que tinha
como proposta explorar diferentes sonoridades das periferias brasileiras. O
programa viajou por Recife, Salvador, Belém e é claro, São Paulo. É muito provável que esta tenha sido a ponte
dos rappers para o especial em homenagem a Vinicius de Moraes.
Segundo Hermano Vianna, a ideia do
programa não é descobrir novos talentos, mas ao contrário, mostrar para a
grande mídia as músicas que circulam nas periferias, na boca do povo, e que fazem
sucesso à margem da indústria fonográfica. Uma cultura produzida na periferia
para a periferia que está longe de ser homogênea:
A grande maioria das atrações
musicais do programa é formada por ídolos de massa, já consagrados pelas
multidões das periferias. Ou são projetos sociais que já influenciam
decisivamente a vida de suas favelas, e contam com apoios internacionais. Mas
que em sua maioria nunca apareceram na TV em rede nacional. (VIANNA, s/d).
O programa feito em São Paulo, na
Favela de Heliópolis, levou ao palco vários artistas e dentre eles o rapper
Criolo Doido, que convidou Rael da Rima e Terra Preta para apresentarem com ele
o rap “Ainda há Tempo”, mesmo rap que um ano depois ele iria cantar na sua
versão de “Samba da Bênção”. Regina Casé ficou encantada com Criolo Doido e
profetizara ali que nós ainda iríamos ouvir falar muito sobre ele.
Quem se acostumou a ver Criolo de
2011 pra cá, quando seu disco Nó na
Orelha atingiu um grande sucesso de crítica, quase não reconhece o menino
Cléber Gomes, magricelo e de óculos apresentando o Grajaú com muito orgulho no
programa de Regina Casé. Questionado sobre seu apelido, Criolo, ele explica que
é filho de pai preto e mãe mais clara, e que usa o apelido como provocação
mesmo, para quebrar o paradigma do que se espera de um Criolo (nas palavras
dele “um armário da zaga da seleção brasileira”) e reitera que não há como
pensar em um nascido no Brasil que não seja afrodescendente.
Tal qual Vinicius de Moraes que deu
a si o epíteto de branco mais preto do Brasil, Cléber Gomes se orgulha de sua
origem afro e escolhe ser chamado de Criolo. “Pronto pra rimar um doido, criolo
mestiço. Eu não sou preto, eu não sou branco, eu sou do rap, eu sou bem isso!”,
diz o rap “Ainda há tempo”.
À espera de outras conversas
No seu texto sobre o programa Central da Periferia, Hermano Vianna afirma
categoricamente:
Não tenho dúvida nenhuma: a
novidade mais importante da cultura brasileira na última década foi o
aparecimento da voz direta da periferia falando alto em todos os lugares do
país. A periferia se cansou de esperar a oportunidade que nunca chegava, e que
viria de fora, do centro. A periferia não precisa mais de intermediários
(aqueles que sempre falavam em seu nome) para estabelecer conexões com o resto
do Brasil e com o resto do mundo. Antes, os políticos diziam: "vamos levar
cultura para a favela." Agora é diferente: a favela responde: "Qualé,
mané! O que não falta aqui é cultura! Olha só o que o mundo tem a aprender com
a gente!” (VIANNA, s/d)
A
própria periferia fala de si por si, produz um universo cultural muito rico,
que passa ao largo do centro hegemônico. Rompe-se aqui com a ideia de que o
centro deveria incluir a periferia, como se ela fosse apenas um lugar de
miséria, sem cultura. A periferia não só tem cultura, como produz para si,
muitas vezes renovando a própria forma de se pensar produção, reprodução e
distribuição nos paradigmas dados pela grande indústria fonográfica.
A grande transformação do sentido das canções
de Vinicius foi essa: o próprio morro fala de si, por si e para si. Não há a
mediação da classe média esclarecida que compreende a necessidade de ir ao
povo.
Além do morro agora falar com a sua
própria voz, ele carrega através da voz dos rappers a esperança e mensagem de
possibilidade de transformação. E só pode crer e anunciar a transformação
aquele que realmente vivenciou uma: nos discursos dos raps entoados não apenas
no Som Brasil, mas em outros
trabalhos dos três, fica claro como o hip hop aparece como agente transformador
da vida dos jovens nas periferias assoladas pela violência e pelo descaso. Como
na letra do rap “Na Moral”, do Grupo Pentágono: “Não foi por nada que hip-hop apareceu na minha casa e me falou que vai
chegar na sua casa, que é pra deixar o clima namoral...(...)Sei que vai me
mudar, sei que vai te mudar, sei que vai libertar, sei que vai.”
Não podemos ainda de deixar de
pensar na ligação presente entre os rappers e as canções escolhidas para serem
interpretadas: o rappers estão na periferia e entoaram aquilo que está mais
periférico na memória oficial sobre Vinicius, sua negritude. Uma negritude que
foi escolhida pelo poeta e mais que apenas cantada, foi vivida por ele. O
máximo que se menciona por alto são Os Afro Sambas, esquecendo-se de tantas outras
obras nas quais Vinicius de Moraes mostrou ser um homem engajado com a vida e
por isso engajado na arte, como as canções ao lado de Carlos Lyra, na época da
chamada Bossa Nova nacionalista, em que compôs sambas como “Maria Moita”: “vou
pedir a meu babalorixá, pra fazer uma oração pra Xangô, pra por pra trabalhar
gente que nunca trabalhou”. Ou ainda o Vinicius de Moraes que viveu na Bahia,
frequentando o terreiro de Mãe Menininha do Gantois, colhendo matéria para
canções que compôs ao lado de Toquinho como “Maria vai com as outras”,
“Tatamirô”, “Canto de Oxum”.
Há aqui um duplo movimento de
visibilidade e respeito bastante necessário: a visibilidade do rap e das
culturas de periferia e a visibilidade de Vinicius de Moraes como um artista
que foi muito mais do que o parceiro de Tom Jobim, “criador da Bossa Nova”.
Relembrando aqui nossa arquitetônica
teórica, para Bakhtin o ato estético é (deve ser) um ato responsável. Arte e
vida não são a mesma coisa, mas devem se influenciar mutuamente. É com a
matéria da vida que o homem faz sua arte; e é através da fruição estética que o
homem ressignifica sua vida e seus valores. Não devemos ser impostores na vida,
mas sim ocupar nosso lugar único e singular, vivendo eticamente.
Vinicius de Moraes viveu esta relação
entre arte e vida, assim como os rappers e destacamos aqui em especial a figura
aqui tão mencionada de Criolo Doido.
Esperamos então o dia em que as
músicas mais cantadas e comentadas de Vinicius forem as esquecidas, engajadas e
negras. Assim como esperamos que na capa dos próximos DVDs estejam estampados
de igual para igual as fotos dos rappers e dos “monstros sagrados da MPB”, com
seus nomes escritos em letras garrafais...
Referências bibliográficas
BAKHTIN, Mikhail. A Cultura Popular na Idade Média e no Renascimento. O contexto de François
Rabelais. São Paulo-Brasília: Ed.HUCITEC - Ed. UNB, 2008.
_______. Estética
da Criação Verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
_______. Discurso
na vida e discurso na arte. Texto publicado em russo, em 1926, sob o título
“Slovo v zhizni i slovo v poesie” na revista Zvezda nº 6, e assinado por V. N.
Voloshinov. A tradução feita por Carlos Alberto Faraco e Cristovão Tezza, para
uso didático, tomou como base a tradução inglesa de I. R. Titunik (“Discourse
in life and discourse in art concerning sociological poetics, publicada em V.
N. Voloshinov, Freudism, New York: Academic Press, 1976).
_______. (VOLOCHINOV) Marxismo e Filosofia da Linguagem problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem.
8. ed. Tradução por Michel Laud e Yara
Frateschi Vieira. São Paulo: Hucitec, 1997.
_______.Questões
de Literatura e de Estética (A Teoria do Romance). São Paulo: Ed. Unesp,
1998
NAPOLITANO, Marcos. Forjando a revolução, remodelando o mercado: a arte engajada no Brasil
(1956-1968) In FERREIRA, Jorge e REIS, Daniel Aarão (org). Nacionalismo e Reformismo radical
(1945-1964) Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007. (As esquerdas no
Brasil; v.2)
NAPOLITANO, Marcos. WASSERMAN, Maria Clara. Desde que o samba é samba: a questão das
origens no debate historiográfico sobre a música popular brasileira. In: Revista Brasileira de História. São
Paulo, v. 20, nº 39, p.167-189. 2000. Disponível em <http://www.scielo.br/pdf/rbh/v20n39/2985.pdf.>
TATIT, Luiz. Musicando
a semiótica: ensaios. São Paulo: Annablume 2008
_______. O
século da canção. Cotia: Ateliê Editorial, 2004.
TINHORÃO, José Ramos. História social da música popular brasileira. Lisboa: Caminho,
1990.
VERGUEIRO, Marina. Arte sempre existiu na periferia,
mas o preconceito cegou as pessoas, diz rapper Criolo. In Periferia em Movimento Disponível em: <http://periferiaemmovimento.wordpress.com/2011/06/04/grajauex-criolo-doido-no-uol/>
VIANNA,
Hermano. Central da Periferia. Disponível em: <http://www.gabrieltorres.xpg.com.br/puc/central_periferia_hvianna.pdf>
SOM BRASIL Vinicius de Moraes.
Direção: Mário Meirelles, Luiz Gleiser. Apresentação: Patrícia Pillar. Roteiro:
Rafael Dragraud e David Peoples. Música: Vangelis. Estúdio: Som Livre. São
Paulo: Globo Marcas/Som Livre, 2009. 1 DVD (43 min aprox.)
[1] Isabela Martins de Morais e
Silva. Mestranda em Sociologia/Ciências Sociais pelo Programa de Pós Graduação
em Sociologia da Faculdade de Ciências e Letras da Unesp Araraquara. Bolsista
CAPES. Orientador: Prof. Dagoberto José Fonseca. Av. São José 474A, São José,
Araraquara – SP. CEP 14 800 410. isabelamoraistp@gmail.com
[2] Primeiros versos do rap “Sucrilhos”,
de Criolo Doido, em Nó na Orelha
(2011).
[3] Verso da canção “Marcha da
Quarta-feira de Cinzas”, de Vinicius de Moraes e Carlos Lyra (1963).
[4] Verso entoado por Vinicius de
Moraes em Samba da Benção